TEMA 1
IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL
DE CULTURA
Foco: Impactos da Emenda Constitucional do
SNC na organização da gestão cultural e na participação social nos três níveis
de governo (União, Estados/Distrito Federal e Municípios).
1.1 – Marcos legais, participação e
controle social e funcionamento dos Sistemas Municipais, Estaduais/Distrito
Federal e Setoriais de Cultura, de acordo com os princípios constitucionais do
SNC
Um dos grandes desafios a ser
enfrentado na gestão de políticas públicas de cultura diz respeito às relações
intergovernamentais, que é o de organizar e equilibrar o direito à fruição e
produção de cultura, pelos cidadãos, com o modelo tripartite de federalismo,
instituído pela Constituição Brasileira de 1988, num contexto de desigualdades
inter e intraestaduais. Os entes federados são dotados de autonomia
administrativa e fiscal, com compartilhamento de poderes nos seus respectivos
territórios. Essa autonomia pressupõe repartição de competências para o
exercício e desenvolvimento de sua atividade normativa: cabem à União as
matéria e questões de interesse geral, nacional; aos estados, as matérias e
assuntos de interesse regional; e aos municípios, os assuntos de interesse
local.
Assim como a área da Saúde e da
Assistência Social, que possuem arranjos muito complexos de atuação, envolvendo
as três esferas federativas e a sociedade, a Cultura precisa organizar
sistematicamente suas políticas e recursos, por meio da articulação e pactuação
das relações intergovernamentais, com instâncias de participação da sociedade,
de forma a dar um formato político-administrativo mais estável e resistente às
alternâncias de poder. A organização sistêmica, portanto, é uma aposta para
assegurar continuidade das políticas públicas de Cultura – definidas como
políticas de Estado -, que tem por finalidade última/basal garantir a
efetivação dos direitos culturais constitucionais dos brasileiros.
Emenda Constitucional nº 71, que acrescentou o
Artigo 216-A à Constituição Federal – promulgada em 29 de novembro de 2012.
“Art. 216-A. O Sistema Nacional de Cultura, organizado em
regime
de colaboração, de forma descentralizada e
participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de
políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os
entes da federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento
– humano, social e econômico – com pleno exercício dos direitos culturais.
Parágrafo 1º. O Sistema Nacional de Cultura fundamenta-se
napolítica nacional de cultura e nas suas diretrizes, estabelecidas no Plano
Nacional de Cultura, e rege-se pelos seguintes princípios:
1. diversidade das expressões culturais;
2. universalização do acesso aos bens e serviços
culturais;
3. fomento à produção, difusão e circulação de
conhecimento e bens culturais;
4. cooperação entre os entes federados, os agentes
públicos e privados atuantes na área cultural;
5. integração e interação na execução das políticas,
programas, projetos e ações desenvolvidas;
6. complementaridade nos papéis dos agentes
culturais;
7. transversalidade das políticas culturais;
8. autonomia dos entes federados e das instituições
da sociedade civil;
9. transparência e compartilhamento das informações;
10. democratização dos processos decisórios com
participação e controle social;
11. descentralização articulada e pactuada da gestão,
dos recursos e das ações;
12. ampliação progressiva dos recursos contidos nos
orçamentos públicos para a cultura.
Parágrafo 2º. Constitui a estrutura do Sistema Nacional de Cultura,
nas respectivas esferas da federação:
1. órgãos gestores da cultura;
2. conselhos de política cultural;
3. conferências de cultura;
4. comissões intergestores;
5. planos de cultura;
6. sistemas de financiamento à cultura;
7. sistemas de informações e indicadores culturais;
8. programas de formação na área da cultura; e
9. sistemas setoriais de cultura.
Parágrafo 3º. Lei federal disporá sobre a regulamentação do
Sistema Nacional de Cultura, bem como de sua
articulação com os demais sistemas nacionais ou políticas setoriais de
governo.
Parágrafo 4º. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão seus respectivos sistemas de cultura
em leis próprias.”
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Todo sistema é um conjunto de partes
interligadas que interagem entre si. Os sistemas não são a simples soma de suas
partes, pois têm certas qualidades que não se encontram nos elementos
concebidos de forma isolada.
Partindo do conceito acima, o Sistema
Nacional de Cultura é um conjunto que reúne a sociedade civil e os entes
federativos da República Brasileira – União, estados, municípios e Distrito
Federal – com seus respectivos Sistemas de Cultura. As leis, normas e
procedimentos pactuados definem como interagem os seus componentes, e a
Política Nacional de Cultura e o Modelo de Gestão Compartilhada constituem–se
nas propriedades específicas que caracterizam o Sistema.
Componentes do Sistema Nacional de
Cultura
O Plano de Cultura é um instrumento de gestão de
médio e longo prazo, no qual o Poder Público assume a responsabilidade de
implantar políticas culturais que ultrapassem os limites de uma única gestão de
governo. O Plano estabelece estratégias e metas, define prazos e recursos
necessários à sua implementação. A partir das diretrizes definidas pela Conferência de Cultura, que deve contar com ampla participação da sociedade, o Plano é
elaborado pelo órgão gestor com a colaboração do Conselho de Política Cultural, a quem cabe aprová-lo. Os
planos nacional, estaduais e municipais devem ter correspondência entre si e
ser encaminhados pelo Executivo para aprovação dos respectivos Poderes
Legislativos (Congresso Nacional, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores),
a fim de que, transformados em leis, adquiram a estabilidade de políticas de
Estado3.
Daí a importância da participação da
sociedade nas Conferências de Cultura (aprovação de diretrizes) e nos Conselhos
de Cultura (aprovação e monitoramento do Plano de Cultura).
1.2- Qualificação da gestão cultural:
desenvolvimento e implementação de Planos Territoriais e Setoriais de Cultura e
Formação de Gestores, governamentais e não governamentais, e conselheiros de
cultura4
Assim como em outras áreas, o setor
cultural necessita profissionais cada vez mais capacitados, bem como maior
planejamento de ações. A complexidade da cultura e as especificidades de cada
setor ocasionam a necessidade de planejamentos próprios, porém, em diálogo com
os demais setores e segmentos artísticos. Da mesma forma, ocasiona a
necessidade de oportunidades de formação global e também específicas, além da
formação em linguagens artísticas. Nesse sentido o Sistema de Formação na Área
da Cultura, componente do Sistema Nacional, Estaduais e Municipais de Cultura,
pode ser estruturado de forma a contemplar e manter o diálogo das ações
formativas entre os diversos setores e profissionais.
A proposta do Ministério da Cultura
para o Programa de Formação na Área da Cultura aponta para o conjunto de
iniciativas de qualificação técnico-administrativa – cursos, seminários e
oficinas – de agentes públicos e privados envolvidos com a gestão cultural, a
formulação e a execução de programas e projetos culturais. A formação de
pessoal é estratégica para a implantação do Sistema Nacional de Cultura, pois a
gestão cultural é uma área que ainda se ressente da falta de profissionais com
conhecimento e capacitação. Para atingir todos os estados e municípios, deverá
ser organizada uma rede nacional de formação na área da cultura, com base no
mapeamento e avaliação das instituições que oferecem cursos de política e
gestão cultural no Brasil5, mas complementando esta ação do
Ministério da Cultura, os municípios podem e devem organizar estruturas
formativas de acordo com suas necessidades.
1.3 -
Sistemas de Informação Cultural e Governança Colaborativa.
A ferramenta para
coletar, armazenar, estruturar e difundir dados e informações sobre a cultura
brasileira (expressões culturais; patrimônio cultural material e imaterial;
gestão pública e privada; infraestrutura; bens, serviços e investimentos;
produção, acesso e consumo; agentes, grupos e instituições) é o Sistema
Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC), institucionalizado
pela Lei do PNC e em gestação no MinC. A novidade da plataforma virtual do
SNIIC é reunir os conceitos de “dados abertos”, “governo como plataforma” e
“participação cidadã”. Atuar por dados abertos traduz o compromisso com a
transparência e a possibilidade de que vários agentes, situados em pontos
diversos de uma vasta rede informacional, possam alimentar de dados o Sistema e
deles se servirem para aplicações diversas, incluindo a criação de negócios e
empreendimentos. Governo como plataforma explicita o papel do Estado como
facilitador do processo de captação e organização das informações, situando-se
como mediador entre os dados públicos e os cidadãos. O conceito de participação
cidadã, por sua vez, pressupõe uma plataforma virtual amigável que
disponibiliza os dados e permite a qualquer cidadão monitorar a utilização dos
recursos públicos e influir na formulação das políticas culturais. O SNIIC, em
síntese, potencializa a participação direta da sociedade civil por meio de
interfaces típicas das mídias sociais. A isso se dá o nome de “governança
colaborativa”. O grande desafio é construir o consenso em torno de uma
tipologia aplicada ao mundo da cultura - que é vasto e diverso -, a fim de
tornar possível o desenvolvimento de séries históricas e viabilizar comparações
necessárias ao acompanhamento das políticas culturais.
1.4 -
Fortalecimento e Operacionalização dos Sistemas de Financiamento Público da
Cultura: Orçamentos Públicos, Fundos de Cultura e Incentivos Fiscais.
Para alcançar metas
é preciso que haja recursos para o financiamento do SNC. Trata-se, em primeiro
lugar, de buscar um equilíbrio entre os mecanismos de fomento: orçamentos
públicos, fundos de cultura e incentivos fiscais. No Brasil, nos diferentes
níveis de governo, há uma desproporção entre a quantidade de recursos alocados
pela via do incentivo fiscal, que são a maioria, e os existentes nos orçamentos
e fundos de cultura. Isso gera desigualdades, principalmente regionais. Para o
SNC, que tem entre seus objetivos universalizar o acesso aos bens e serviços
culturais e fomentar a cooperação entre os entes federados, os instrumentos de
financiamento mais adequados são os orçamentos públicos e os fundos de cultura.
Essas modalidades estão previstas no projeto de revisão da
lei Rouanet (Procultura),atualmente em tramitação no Congresso Nacional. Nele
há artigos que tratam especificamente do “Apoio ao Financiamento do Sistema
Nacional de Cultura”. Lá está dito que a União deverá destinar aos Estados e
Municípios no mínimo 30% (trinta por cento) dos recursos do Fundo Nacional de
Cultura (FNC), por meio de transferência direta aos fundos públicos municipais,
estaduais e do Distrito Federal. Do montante geral destinado aos Estados 50%
(cinquenta por cento) deverá ser repassado aos Municípios. A aprovação do
Procultura deve estar associada ao fortalecimento do Fundo Nacional de Cultura,
forma de fazer com que o mecanismo de transferência fundo a fundo seja capaz de
fomentar o desenvolvimento cultural em todos os estados e municípios integrados
ao SNC. Há alternativas de financiamento que também podem corrigir a desigualdade
no acesso da população à cultura, tanto do ponto de vista regional como social.
Mecanismos como o Vale-Cultura, os Microprojetos, que incentivam ações
culturais em regiões desassistidas, e a maior pontuação, nas leis de incentivo,
de projetos de circulação de bens culturais.
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